quarta-feira, 27 de abril de 2011

Eu tinha que começar a fazer alguma coisa dos meus dias. Sentia que a minha vida não podia ser só isto. Nem devia. Sabem quando temos a sensação de que um dia ainda iremos fazer algo de grandioso na vida? Eu sinto-o vezes sem conta. Quando me perco a ver séries tristes na televisão envolta numa manta grossa, de cigarro numa mão, caneca de chá na outra e um lenço de papel entre os dedos para me enxugar as lágrimas sinto que estou a desperdiçar tempo. Um tempo que podia ser gasto em coisas que me levassem um pouco mais longe. Sinto que a minha vida não é aqui – nem é isto. Sempre quis viver noutro lugar, longe daqui, de todos, dos outros. Mas há alguma coisa que me prende e não me deixa fugir. De onde virá este instinto que me afronta o ser que quer ir mais além? De onde virá esta coisa que me prende e que não me deixa ir mais além? A temperatura sobe, desce, a chuva cai, sai, vem o sol, a noite, as estrelas, o tempo passa – tique-taque; tique-taque – mando a agenda fora, compro uma nova – vermelha como eu gosto – passam as horas – mais uma noite, só mais uma cerveja, um cigarro, uma música, deixem-me estar, não quero falar, não quero prestar-te atenção, deixem-me dançar, sem pensar que me estão a olhar, quero ser livre.


Laura

sexta-feira, 22 de abril de 2011

eu tinha que começar a fazer alguma coisa dos meus dias à medida que eles derretiam, lentos, alheios às minhas próprias expectativas. sempre fui tudo sem ser nada, e os meus dias, e todas as horas neles incutidos, sempre morreram na praia, apodrecendo na areia, os meus dias os meus sonhos fora do prazo de validade e a vontade que, azeda, desmaiava em mim.

sábado, 16 de abril de 2011

Eu tinha que começar a fazer alguma coisa dos meus dias. Foi no curso de escrita criativa que encontrei algo que me manteria acordada toda a noite sem as horas de culpa na manhã seguinte. É a primeira aula e estou tão impaciente que saio mais cedo de casa duas horas e perco-as na baixa Lisboeta, sozinha de um lado para o outro. Compro um bloco bonito e duas canetas Uni-Ball, engulo um café americano e uma tosta mista especial, e finalmente, às nove e meia, posso subir para o terceiro andar daquele prédio antigo no Largo Camões e deixar os problemas cá em baixo. O meu reflexo no espelho do elevador dá-me tudo, confiança, gosto do olhar que lanço a mim própria, esta sou eu, mais uma rapariga solitária e ansiosa para deixar fluir a sua criatividade numa cidade em que há sempre coisas mais importantes a acontecer e o coração aperta no peito. Eu sabia que o tipo de pessoas que vêm a estas aulas são pessoas que gastam aqui as horas que têm livres além do trabalho cansado e da família que é sempre igual, escondem-se aqui neste mundo, a um curso temático de cada vez. São sempre as mesmas pessoas, aborrecidas com as palavras rígidas e formais das secretárias em que se sentam todos os dias das nove às seis, e depois vêm aqui e procuram reencontrar as palavras que já não se lembravam de escrever em composições na escola há muito tempo atrás. Entro e preencho uma folha com o meu nome e todos os outros factos de que eles precisam para saber quem sou eu, pessoa individual, mais uma no meio de tantas outras. A sala tem como som ambiente o meu álbum preferido da minha banda preferida. Não me posso sentir mais em casa. Já estão algumas pessoas presentes, o que eu esperava, idades diversas e estilos de vida também, uns com filhos, outros sem, uns com mais que fazer outros com horas para gastar. Para mim é a tentativa um refúgio da pessoa aborrecida que sou, tão inspirada durante todas os dias da semana com frases e histórias dentro de mim, o meu passar dos dias acompanhada de filmes antigos e romances epistolares, admirar o que os outros fazem para eu ver, deixar-me morrer na preguiça e o medo de enfrentar a folha branca. Preciso de um empurrãozinho, de uma maneira de me desligar do correr frenético que é a vida e os problemas, tudo a palpitar numa nuvem negra por cima da cabeça, que me tira constantemente a vontade de sonhar e completar a minha história com histórias minhas. Preciso de estar entre quatro paredes brancas, procurar na cabeça e no coração os cenários que ainda não vi. Pode ser este o empurrãozinho de que preciso.



(História baseada em factos reais, talvez continue)
- Foto do meu diário visual 
Catarina